Naquela ficha eu tinha que inserir um dado que indicasse meu local de trabalho. Sem aquilo eu não poderia continuar o cadastro. Sem aquele campo eu não seria ninguém. Seria como se eu passasse pela rua, em meio a uma multidão de pessoas e ninguém me visse. Ninguém me considerasse. Ninguém me tratasse como um ser igual. Aliás, no caso específico eu seria o ninguém. E não os outros. Os outros teriam nomes, sobrenomes e profissão. Eu não. Eu seria um ninguém desabrigado de mundos, de histórias, de desejos, de sonhos. Quer dizer, de sonhos não. Teria um sonho obrigatório: o de um emprego. Não o de algo que me realizasse como ser que, afinal, não era. Mas que honrasse meu nome no trabalho. Em algum escritório, empresa, repartição, rua, no que fosse, mas que tivesse horas dedicadas a tarefas cotidianamente repetidas para eu conseguir o dinheiro que me garantisse o pão. Caso contrário, seria eternamente um troço qualquer a ser observado com a piedade alheia que nunca é tão piedosa assim quando não se remete a si própria. Mas no momento em questão, eu não tinha o que preencher naquele campo. Rasguei a folha, joguei-a no lixo, e caminhei pela rua. O estranho é que no meu caminho de volta ninguém esbarrou mesmo em mim.
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